Nota do Setorial Estadual de Direitos Humanos do PT
O Projeto de Lei 1481/23 da Bancada da Bala na Alesp modifica a composição do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana – Condepe, dando ao Governador a escolha de todos os membros, inclusive os representantes da sociedade civil”.
Os deputados Carlão Pignatari, Capitão Telhada, Major Meca e Delegado Olin, da chamada “Bancada da Bala” na Alesp, conseguiram a tramitação de urgência para o PL 1481/23, que, além de apresentar diversos vícios legislativos, como por exemplo números a mais de conselheiros e outras técnicas jurídicas, contém profundos vícios de ordem democrática e constitucional.
O primeiro desses vícios: sendo o Conselho um órgão de Estado, criado pelo artigo 110 da Constituição Paulista, modificações em sua estrutura e forma de atuar competem exclusivamente ao poder executivo, e não ao legislativo. Outro vício refere-se à forma: sendo um órgão de estado, com ocupação de vagas pela sociedade civil, não compete ao governador indicar por ato, mas tão somente nomear as indicações. No caso da sociedade civil, estas indicações partem de seus próprios foros.
Não menos grave, todavia, é a iniciativa legislativa contra a Constituição Federal. Vejamos as razões. A constituição brasileira estabeleceu sistemas de gestão democrática em vários campos da administração pública.
Temos o exemplo do planejamento participativo (mediante a cooperação das associações representativas no planejamento municipal, como preceito a ser observado pelos municípios – Art. 29, XII); no campo da educação, a gestão democrática do ensino público (Art. 206, VI); a gestão administrativa da seguridade social (com a participação quadripartite de governos, trabalhadores, empresários e aposentados – Art. 114, VI) e ainda a proteção dos direitos da criança e do adolescente.
Esses exemplos existem pelo fato de que a Constituição Federal de 1988 declara que o Brasil é um Estado Democrático de Direito, que tem dentre seus fundamentos a cidadania (Art. 1º, II). Segue o texto instituindo um conjunto de mecanismos necessários ao exercício dessa cidadania, destacando-se, em relação à gestão pública, o chamado direito à participação, a ser regulamentado através de lei (Art. 37, §3º. “A lei disciplinará as formas de participação do usuário na Administração Pública direta ou indireta”).
O artigo 193 trata de forma ainda mais explicita a participação, com menção direta a “trabalhadores, empresários e aposentados”. O artigo 198 trata das ações e dos serviços públicos de saúde, cuja diretriz geral é a “participação da comunidade”. O artigo 204, que trata das ações governamentais na área da assistência social, estabelece a participação da população por meio de organizações representativas na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis”.
É possível afirmar, categoricamente, que o referido PL fere princípios elementares da Constituição Brasileira. Ao tentar modificar o CONDEPE – que desde sua criação por lei, sempre cumpriu seu papel com independência e autonomia garantidas pela mesma lei – revela-se a intenção da conhecida “Bancada da Bala” de fazer com que o Governador tenha total controle sobre o Conselho, influenciando diretamente na indicação do Ouvidor da Polícia, por exemplo.
Além do desmonte da participação e controle da sociedade civil, a proposta fere os princípios de Paris: na Conferência Mundial sobre Direitos Humanos em 1993, foram adotadas por consenso a Declaração e Programa de Ação de Viena, como uma análise global do sistema internacional de Direitos Humanos e dos seus mecanismos de proteção.
Em sua Parte I, parágrafo 36, dispõe acerca das INDH: “Destarte, de acordo com os Princípios de Paris, as instituições nacionais de direitos humanos (INDH) são órgãos públicos (não são ONGs), porém independentes, cuja missão específica é a proteção dos direitos humanos. Para tanto, recebem notícias de violações de direitos humanos e recomendam ações e políticas para implementação de tais direitos”
A Instituição Nacional de Direitos Humanos, portanto, deve ser uma instituição pública, de alcance amplo, com mandato independente, com forte representatividade social, autonomia política, com dotação orçamentária própria, para atuar nos casos de violações de direitos humanos, para melhor exercer sua missão. Elas são, cumpre ressaltar, fundamentais para a promoção dos direitos humanos, interagindo com os sistemas de proteção nacional de direitos humanos e com os sistemas internacionais de direitos humanos.
Ao tentar modificar o Condepe, sequestrando sua histórica autonomia e independência, este PL impele o Estado de São Paulo à um retrocesso aos tempos da Ditadura Militar, impedindo que haja apuração de violações de direitos humanos, para citar uma de seus graves descaminhos. Mas, bem o sabemos, este é o caminho pelo qual trilha esta bancada e seu guia-mor, o governador Tarcísio de Freitas.
Esta não é a primeira tentativa da ignominiosa bancada desferir um tiro mortal no Condepe e também na Ouvidoria da Polícia. O Setorial de Direitos Humanos do PT, sabedor dessas artimanhas e flagrantes violações ao estado de direito, conclama todas as filiadas e filiados, movimentos sociais e entidades de direitos humanos a cerrarem fileiras nesta luta: usando suas redes sociais e articulações de direitos humanos, demonstrando total repúdio ao Projeto de Lei 1481/23 e suas iniciativas de interferência nos órgãos públicos de controle social, que são espaços de democracia e, acima de tudo, de direitos humanos.
Conclamamos também nossa aguerrida e competente bancada do PT na ALESP, esta sim, a “bancada da vida”, a reprovar o PL 1481/23.
São Paulo, 30 de novembro de 2023.
Coordenação Setorial Estadual de Direitos Humanos PT
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