No início deste mês, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos) lançou uma cartilha sobre a privatização da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), com o objetivo de convencer a população paulista que a venda do patrimônio público beneficiará a toda população.
O governo afirma no material que a privatização irá ampliar investimentos no Estado, reduzir as contas de água, melhorar os serviços e ampliar o número de cidadãos atendidos pela empresa.
Mas, para o especialista Pedro Luiz Côrtes, professor titular da Escola de Comunicações e Artes (ECA) e do Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da USP (Universidade de São Paulo), nada disso pode ser garantido.
A privatização da Sabesp será feita por meio de uma oferta de ações em um modelo similar ao que foi utilizado na privatização da Eletrobras, anunciou esta semana o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.
O modelo, denominado follow on, prevê a diluição das ações em poder do governo do Estado, que hoje detém 50,3% de participação na Sabesp. O governo renunciará ao controle da empresa e permitirá que investidores possam ter maior participação sobre o negócio, atuando em um direcionamento de longo prazo.
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Problemas
Uma das justificativas apresentadas pelo governador para a privatização é a de que ela poderia levar a uma antecipação das metas de universalização.
Pedro Luiz Côrtes explica que metas são essas: “Essas metas são um dos frutos do Marco Legal do Saneamento Básico, que determina que a população de todo o Brasil tenha acesso a água tratada e coleta de esgoto até 2033 e, segundo o governador, com a privatização da Sabesp seria possível antecipar essas metas para 2029. Entretanto, não há estudos que fundamentem essas declarações”, argumenta.
Outro empecilho é o modelo de privatização, que ainda não foi totalmente definido pelo Estado.
“Embora tenha sido delineado como follow on, ele ainda não foi finalizado. Por exemplo, não se sabe qual será a participação máxima do governo. Eles dizem que vão seguir o modelo da Eletrobras, onde cada acionista não pode ter um voto superior ao equivalente a 10% das ações e o governo tem o chamado golden share, que é uma possibilidade de vetar determinadas decisões que o conselho venha a tomar caso ele julgue que isso fere interesses nacionais”, explica Côrtes.
O professor também defende que não é possível avaliar quanto o governo pode arrecadar com isso, uma vez que o preço das ações será definido pela própria Bolsa de Valores. “É colocado um número sem que haja um estudo que defenda isso e sem que haja um delineamento de questões importantíssimas relacionadas a essa diluição das ações”, complementa.
Política tarifária
A promessa de redução de tarifa também é inconsistente, uma vez que quem decide os valores das tarifas é a Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (Arsesp).
A agência possui autonomia administrativa e orçamentária e faz a regulação de diversos serviços, como a distribuição de gás encanado, bem como a definição dos preços para os serviços de saneamento. A Arsesp negocia o valor da tarifa, portanto, junto ao prestador de serviço.
“Em grande parte do Estado os municípios estão se organizando em blocos para contratar os serviços de saneamento, que poderá ser contratado junto à Sabesp ou a outros prestadores de serviço a partir do marco regulatório do saneamento.
Os municípios podem contratar a Arsesp para fazer essa intermediação com o prestador de serviço de saneamento, como eles podem decidir por conta própria. O governo do Estado não tem como garantir que isso vai levar a uma redução de tarifa, porque ele não atua diretamente na redução da política tarifária”, esclarece Côrtes.
O governo também alega que haverá injeção de capital, mas não seria necessário que houvesse privatização para isso acontecer. “Ele [governo] pode ampliar a oferta de ações, mas retém para si uma parte dessas ações mantendo o controle, e é claro que ele vai ter que participar dessa capitalização, mas ele poderia captar recursos no mercado dessa forma.” E conclui:
“A população no final pode ser chamada a pagar uma conta para a qual ela não foi orientada, uma conta que ela não precisaria pagar”.
No dia 15 do mês passado, representantes dos trabalhadores da Sabesp se reuniram com o coordenador da Frente Parlamentar contra a Privatização da empresa, deputado Emídio de Souza (PT) para discutir ações com prefeitos, entidades civis e políticos, com o objetivo de defender que a empresa continue estatal.
O encontro definiu o lançamento de um comitê de organização para ampliar a mobilização de diversos setores da sociedade para pressionar o governador Tarcísio de Freitas a desistir da proposta de privatização.
O Sindicato dos Urbanitários de Santos e da Baixada Santista (Sintius) afirmou em nota que “o sinal de alerta foi ligado no início de agosto, quando o governador Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos) anunciou o modelo de privatização da Sabesp, no qual o governo paulista seguirá como acionista minoritário, ou seja, o controle e a gestão da empresa, incluindo a definição de prioridades de investimentos, não serão definidos pelo poder público”.
Em abril deste ano, Tarcísio de Freitas autorizou a contratação do IFC (International Finance Corporation), órgão vinculado ao Banco Mundial, para realizar os estudos de privatização da Sabesp. O processo será feito sem licitação, segundo despacho assinado pelo secretário estadual de Parcerias em Investimentos, Rafael Benini.
Para o deputado Emídio, “a escolha da IFC como responsável pela estruturação da privatização da Sabesp também deve ser avaliada com cautela porquanto a instituição é conhecida por defender políticas neoliberais e de privatização em todo o mundo, o que pode indicar um conflito de interesses na condução desse processo”.
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